Gil de Roca Sales | Obras do compositor e arranjador gaúcho Gil de Roca Sales Obras do compositor e arranjador gaúcho

Acervo

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho…

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria…
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança…

E descalcinhos, doridos…
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
por que lhes dais tanta dor?!…
Por que padecem assim?!…

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.

“Não há exemplo mais comovedor de fidelidade
que os dois chinelos quietos e juntinhos,
esperando pacientemente por nós ao pé da cama.”

“Amor che move Il sole ed altre stelle
Felice voi donne che avete l’intelletto d’amore”.

Querida! Aos pés do leito derradeiro,
em que descansas desta longa vida,
aqui venho e virei, pobre querida,
trazer-te o coração de companheiro.

Pulsa-lhe aquele afeto verdadeiro
que, a despeito de toda a humana lida,
fez a nossa existência apetecida
e num recanto pôs um mundo inteiro…

Trago-te flores – restos arrancados
da terra que nos viu passar unidos
e hoje mortos nos deixa e separados;

que eu, se tenho, nos olhos mal feridos,
pensamentos de vida formulados,
são pensamentos idos e vividos.

“Oh, que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais.
Que amor, que sonhos, que flores,
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais.

Oh, dias de minha infância
Oh, meu céu de primavera
Que doce a vida não era
Nessa risonha manhã.
Em vez de mágoas de agora,
Eu tinha nessas delícias
De minha mãe as carícias
E beijos de minha irmã”.

“Bendito seja o sol de outras terras
Que faz meus irmãos todos os homens
Porque todos os homens, num momento no dia,
O olham como eu.
Por isso a luz do sol vale mais que os pensamentos
De todos os filósofos e de todos os poetas.
Bendito seja o sol”.

“Ah! De leve, beijo as suas mãos pequenas
Alvas, de neve, e, logo, um doce, um breve,
Fino rubor lhe tinge a face, apenas
De leve beijo as suas mãos de neve.

Ela vive entre lírios e açucenas,
E o vento a beija, e, corno o vento, deve
Ser o meu beijo em suas mãos serenas,
— Tão leve o beijo, como o vento é leve.. .

Que essa divina flor, que é tão suave,
Ama o que é leve, como um leve adejo
De vento ou como um garganteio de ave,

E já me basta, para meu tormento,
Saber que o vento a beija, e que o meu beijo
Nunca será tão leve como o vento”.

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo,
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muitas vezes desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite,
enquanto a Via-Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.

Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo? ”

E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”.

“Cultivo una rosa blanca
en junio como en enero
para el amigo sincero
que me da su mano franca.

Y para el cruel que me arranca
el corazón con que vivo,
cardo ni ortiga cultivo;
cultivo la rosa blanca”.

A rosa, rainha das flores, sempre será vaidosa
Enquanto a maravilhosa orquídea
É, por certo, entre todas, a mais humana das flores
Pois só nasce e vive abraçada em outra planta, seja qual for
Haverá mais belo símbolo de humildade e de amor?

Mais brilhará uma flor
Quando se sentir beijada
Por uma gota de orvalho
Ou por um raio de sol.

Ó, lindo cavalo crioulo
Símbolo do Rio Grande do Sul
Sempre acompanhando o gaúcho
Nas suas lides, de sol a sol.
Muito embora de padrão diferente
Tens, contudo, a mesma força e beleza
Do mais belo ser da criação.
Ó cavalo, ó cavalo!

Na ponta da folha, uma haste
Na ponta da haste, um botão
Promessa de flor misteriosa
Só passarão algumas luas
Que uma grande noite o botão
Abrirá em flor, em florão:
Eis agora é “Dama da Noite”,
Verdadeiro milagre em flor!

Mas ai. Tão breve é seu brilho
Brilha uma noite apenas
Ah! Mas tão bela quanto efêmera
Seu doce aroma inebria
Sua brancura imaculada
Faz que a noite seja dia.

Ó, meu Brinco de Princesa, sem igual tua beleza
Ó, flor mágica, formosa, encantaste mesmo a rosa
Ó, flor símbolo do Rio Grande do Sul
Pois no brilho de tuas cores
Brilham as mais belas flores
Ó, meu Brinco de Princesa!

“Senhor, que buscas tu pescar com a rede das estrelas?”

Deus abaixo das estrelas
Fez coisas de endoidecer,
Criou flores as mais belas
E a flor mais bela: a mulher.

Composta para a flor que representa a Paixão de Cristo: os três estigmas correspondem aos três cravos que prenderam Cristo na cruz; as cinco anteras representam as cinco chagas; as gavinhas são os açoites usados para martirizá-lo; no formato da flor, é visível a imagem da coroa de espinhos levada por Cristo para o ato de crucificação. Por fim, os tons de roxo que colorem a flor simbolizam o sangue derramado por Jesus Cristo.

Os anjos no céu cantavam, que se ouviu além da serra:
Glória a Deus nas alturas e paz aos homens na terra.
O galo cantou: Cristo nasceu!
O boi perguntou: aonde, aonde?
E a ovelhinha logo respondeu: foi em Belém!
Para o nosso bem, disse o pastor.

Há uma idade do corpo e há outra idade do espírito.
Por isso há jovens de oitenta como há velhos com trinta.
Mas a vida quer nosso crescimento total,
Pois sempre ensina que os maus com a idade pioram
Enquanto os bons que acreditam no bem, no amor, no perdão
Com a idade melhoram.

Porto Alegre, 2013.

Ser homem é ser responsável.
É ver o mundo como um lar,
Não como um reino a conquistar.
É ver em cada mulher,
A beleza de uma flor.
É ver em cada homem
Não um rival, mas um irmão.

Porto Alegre, 2014.

Maestro Gil recebeu láurea de Comendador pela Sociedade Brasileira de Artes, Cultura e Ensino, Ordem do Mérito Cultural Carlos Gomes, em dezembro de 2012.
Para celebrar a menção honrosa, compôs esta breve peça.

O nome do velho rei Nabucodonosor
era lento, solene e belo como um cortejo religioso
O triste é que seus súditos, para abreviar,
chamavam-no simplesmente de Budú.

Vídeo gravado pelo Coral Banrisul em 30/11/2010.

“A beleza é a forma angélica da verdade” (Mario Quintana)

Esta obra possui versos de Santo Agostinho, Mario Quintana e Goethe sobre a beleza.

Versos avulsos e pensamentos poéticos sobre a lua e o luar, tema recorrente em Quintana

As composições nasceram de uma brincadeira levada a sério. Assim: foi com o “Mapa”, notável poema onde o imaginário de Quintana descreve sua encantada Porto Alegre. Várias vezes tentei dizê-la para mim – em minhas caminhadas, gosto de lembrar poesias que, desde os meus 15 anos, um dia me tocaram – como não lograsse decorá-la, fiz-lhe uma melodia e, em pouco tempo, memorizei letra e música. Da melodia surgiu a harmonia e, de um poema, nasceu a idéia de 12 composições para um concerto a Mario Quintana no seu aniversário (30/07/92). Assim se fez, ele ainda vivo, embora já não pudesse estar presente no concerto.

Nesta obra, há trechos sobre a amizade retirados da Bíblia, de Mario Quintana e de Pascal.

“…E um belo poema, ainda que de Deus se aparte,
Um belo poema sempre leva a Deus”.

Nesta partitura, houve, com a devida permissão do poeta, ligeiras alterações do texto original, inclusive no título: do poema original “Tudo tão vago…”.

Frases (1): Amizade; Frases que matam; Madrigal; Por que não casei

“Todos esses que aí estão, atravancando o meu caminho, eles, passarão – eu, passarinho”

Neste vídeo, o Madrigal de Porto Alegre canta trechos de “Os Poetas” e “Todos os Poemas”.