Gil de Roca Sales | Obras do compositor e arranjador gaúcho Gil de Roca Sales Obras do compositor e arranjador gaúcho

Acervo

Batem leve, levemente,
como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e chuva não bate assim.

É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho…

Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.

Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria…
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!

Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho…

Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança…

E descalcinhos, doridos…
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!…

Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
por que lhes dais tanta dor?!…
Por que padecem assim?!…

E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.

Na ponta da folha, uma haste
Na ponta da haste, um botão
Promessa de flor misteriosa
Só passarão algumas luas
Que uma grande noite o botão
Abrirá em flor, em florão:
Eis agora é “Dama da Noite”,
Verdadeiro milagre em flor!

Mas ai. Tão breve é seu brilho
Brilha uma noite apenas
Ah! Mas tão bela quanto efêmera
Seu doce aroma inebria
Sua brancura imaculada
Faz que a noite seja dia.

Com as bênçãos do autor e amigo Bepi de Marzi, fiz em “Hora Sublime” (Improvviso) o mesmo que em “Pai de Bondade” (Signore delle cime): a quinta voz e a letra em português.

Gravado pelo Madrigal de Porto Alegre na Missa de lançamento do Acervo Digital, na Igreja Nossa Senhora das Dores (29.09.2010)

O autor considera esta música como a mais bela de suas composições. E, certamente, não foi por acaso que ela foi escolhida, por jurados e pelo povo, como a “canção símbolo do Rio Grande”.
Gravado pelo Coral Banrisul (1999).

O termo “Quintanares” foi criado por Cecília Meireles (1910-1964), e solenemente ratificado por Manuel Bandeira, em 1966, na Academia Brasileira de Letras. Posteriormente, o próprio Quintana adotou o termo em seus versos e como título de um de seus livros.